8.2.11

Carta para o prefeito

Prezado prefeito de Curitiba, Sr Luciano Ducci.

Gostaría de desenvolver algumas ideias sobre o futuro da cidade com o senhor:

Sou engenheiro civil, com experiência em planejamento e transporte urbano, sou apaixonado pela cidade e me orgulho sempre quando em eventos do meu setor, Curitiba é citada como exemplo de sucesso em cases de planejamento e transporte urbano.
Porém o que se observa hoje na cidade é um problema preocupante que muitas cidades vêem enfrentando. O crescimento econômico e demográfico desordenado da cidade, aliado ao cego incentivo de consumo e utilização do automóvel com meio de transporte individual que exigem infra estruturas que oneram a cidade, um verdadeiro retrocesso.
Estamos passando por uma fase unica de crescimento da cidade, acompanhando o desenvolvimento econômico do país, em que se escolherá sermos uma cidade a mais no mundo, ou continuar sendo uma cidade com idéias inovadoras, e crescer de uma maneira mais responsável e com vista ao futuro. Estamos perdendo essa vanguarda inovadora que temos, por diversos motivos.
Sei que decisões de infra estrutura sao puramente políticas e que em muitos casos o bom senso técnico é deixado de lado por interesses particulares. Por conhecer pessoas próximas a mim que trabalham com o senhor, sei que o senhor é uma pessoa aberta e correta, e espero que esse tema seja levado com seriedade com o pensamento no real benefício para a cidade.

Sendo assim seria sua oportunidade de fixar-se como prefeito com ideias inovadoras para a cidade, e que isso seja reconhecido futuramente como um administrador que teve a capacidade de enxergar mais longe. Elenco algumas idéias que humildemente imagino serem essenciais para o correto crescimento da cidade:

- metrô
O projeto é bom acredito que esse é o caminho, não competirá com o bi-articulado, deve-se priorizar o transporte de massa com mais capacidade e intervalos menores, o que o ônibus não suporta mais, aproveitando a desapropriação dos eixos estruturais, porêm futuramente deve-se pensar em uma linha radial circular.
Entendo a dificuldade de financiamento, porêm é um projeto que o municipio deve viabilizar, porque infra estrutura é do estado, logo a operação poderia ser privatizada.

- restriçao de tráfego no centro, canaletas exclusivas ônibus.
Deve-se incentivar as pessoas a utilizarem transporte público e manter a calçada confortável para circulação de pedestres, a melhor maneira de se fazer isso é restringir a circulação de veículos, alargando calçadas e dedicando mais canaletas exclusivas para ônibus, binários somente facilitam o fluxo dos carros, a rua fica desconfortável e perigosa para quem está na calçada, e a melhoria de tráfego nunca será suficiente, pois a cada dia aumentará o número de carros, ao se terminar uma obra de melhora de fluxo de veículos esta já estará sobrecarregada.


- sistema integrado de ciclovias
As bicicletas podem e devem fazer parte importante na mobilidade urbana da cidade, tanto pode-se pensar na bicicleta como transporte único, (origem e destino finais) como compartilhada com outro modal de transporte (metrô, ônibus)
Para isso as ciclovias devem ter um protagonismo maior nas vias de rolamento da cidade, além de se reservar espaço para elas nas faixas a direita das ruas, deve-se pensar em um sistema integrado de ciclovias, que acompanhem os eixos estruturais ( o que de fato ocorre hoje em dia com ciclistas nas canaletas ) e ciclovias radiais circulares que interceptem os eixos estruturas, podem alimentar as futuras estações do metrô.


- complementação dos modais
O segredo para uma boa mobilidade urbana, é o pensamento de um sitema que complemente e otimize os modais de transporte, ônibus + metrô, bicicleta + metrô, etc. E que um não crie concorrencia com o outro.

- retomar o espírito de cidade inovadora.
Por último acredito que realizar uma campanha com a população para retomar o orgulho de construir uma cidade inovadora e ecologicamente sustentável, fazer com que as pessoas se tornem comprometidas e responsáveis pelo "novo" crescimento ordenado da cidade.
Assim como na sua época a seperação de lixo foi um sucesso com a família folha, podería-se realizar uma campanha para deixar o carro em casa por exemplo.

Bom essa são somente algumas idéias colocadas de maneira superficial para provocar uma reflexão sobre o andamento das políticas de mobilidade urbana que estão sendo praticadas. Muito deve-se estudar em cima destas propostas.

A disposição para possíveis esclarecimentos.

Murilo Noronha da Luz


8.12.10

Manifesto Movimento Slow Food

Essencial para reflexionar sobre nosso estilo de vida e o que queremos dela...



"O nosso século, que se iniciou e tem se desenvolvido sob a insígnia da civilização industrial, primeiro inventou a máquina e depois fez dela o seu modelo de vida.

Somos escravizados pela rapidez e sucumbimos todos ao mesmo vírus insidioso: a Fast Life, que destrói os nossos hábitos, penetra na privacidade dos nossos lares e nos obriga a comer Fast Food.

O Homo sapiens, para ser digno desse nome, deveria libertar-se da velocidade antes que ela o reduza a uma espécie em vias de extinção.

Um firme empenho na defesa da tranqüilidade é a única forma de se opor à loucura universal da Fast Life.

Que nos sejam garantidas doses apropriadas de prazer sensual e que o prazer lento e duradouro nos proteja do ritmo da multidão que confunde frenesi com eficiência.

Nossa defesa deveria começar à mesa com o Slow Food. Redescubramos os sabores e aromas da cozinha regional e eliminemos os efeitos degradantes do Fast Food.

Em nome da produtividade, a Fast Life mudou nossa forma de ser e ameaça nosso meio ambiente. Portanto, o Slow Food é, neste momento, a única alternativa verdadeiramente progressiva.

A verdadeira cultura está em desenvolver o gosto em vez de atrofiá-lo. Que forma melhor para fazê-lo do que através de um intercâmbio internacional de experiências, conhecimentos e projetos?

Slow Food garante um futuro melhor.

Slow Food é uma idéia que precisa de inúmeros parceiros qualificados que possam contribuir para tornar esse (lento) movimento, em um movimento internacional, tendo o pequeno caracol como seu símbolo."

Folco Portinari, em 09 de Novembro de 1989

24.6.10

Estamos preparados para andar para frente?

Ótimo texto de Plinio Arruda Sampaio.


Voltar a andar pra frente

A classe operária brasileira é jovem. Tem menos de cem anos. Mas como a luta de classes é internacional, pôde aproveitar a experiência do operariado europeu e norte-americano, partindo assim de um patamar elevado.

Em pouco tempo, conquistou a jornada de oito horas, o salário mínimo, a liberdade sindical, as férias e vários outros direitos, incorporados pela Constituinte Federal de 1988 em seu texto.

Pode-se dizer que dos anos trinta aos anos oitenta do século passado, o avanço da classe operária seguiu pari passu o desenvolvimento da indústria, da urbanização e do sentimento de nacionalidade.

Esta marcha ascensional foi interrompida na década de 1990. De lá pra cá, a classe operária só perdeu direitos, amargou diversas derrotas. Entre elas, a mais dura: a traição do partido cujo nascimento liderou, o PT, e que polarizou durante uma década a luta de classes no Brasil. O neoliberalismo avançou no terreno dos ataques a todas as conquistas acumuladas.

Numa conjuntura muito adversa, sua liderança sindical também fraquejou. A CUT deixou de ser um sindicato para transformar-se em uma ONG a serviço do governo.

Os que não aceitaram o recuo, infelizmente, não conseguiram unidade. Conlutas, Intersindical e outros setores do movimento sindical que buscavam fundar uma nova central sindical em um congresso realizado em junho passado não lograram sucesso na empreitada. Não conseguirão com tratativas de cúpula. O que une é a vitória, o que divide: a derrota.

Para conseguir a unidade, é preciso apresentar à massa trabalhadora uma bandeira de luta que possa trazer-lhe uma grande vitória – uma bandeira pela qual valha a pena arriscar-se e até morrer, como o fizeram os “communards” de 1848 e 1871 na França, os sindicalistas de Chicago e tantos movimentos operários ao longo dos últimos duzentos anos.

No contexto econômico criado pela contra-revolução neoliberal, essa bandeira de luta é a redução da jornada de trabalho, sem redução salarial.

Reduzir a jornada de trabalho para ampliar o número de empregos, mas, sobretudo, para liberar o operário do jugo do apito da fábrica e dar a ele o direito de viver para si e não somente para o lucro do patrão. Não se trata mais de melhorar ou de perder menos. Trata-se de avançar, com coragem.

17.5.10

Eyjafjallajoekull !!!

Um pouco mais do vulcão de nome inpronunciável que está transtornado a Europa!!

Iceland, Eyjafjallajökull - May 1st and 2nd, 2010 from Sean Stiegemeier on Vimeo.

11.5.10

A violência na internet

Um texto de Cristovão Tezza.
11/05/10



A piada é velha: a internet veio para resolver problemas que antes não existiam – mas, de fato, fico me perguntando como consegui sobreviver mais de 40 anos sem computador nem internet. Resisto entretanto ao saudosismo bucólico, dos velhos tempos em que, para pagar uma conta ou trocar um cheque, pegava-se uma pesada ficha de bronze e aguardava-se o chamado em altos brados. O caixa colocava uma ficha gigante numa máquina contábil especial, onde marcava créditos e dé­­bitos. Hoje somos nós que viramos todos funcionários dos bancos, trabalhando de graça aos sábados, domingos e feriados, fazendo pagamentos, transferências, aplicações, docs e o que for preciso – e o incrível é que achamos isso maravilhoso.

A toda mudança de patamar de civilização corresponde uma mudança tecnológica, do arado ao computador, que muda, às vezes dramaticamente, o sistema de produção e os pa­­râmetros de relação social. Discutir esses efeitos está longe da pretensão do cronista, que aliás tenta se defender da internet como pode. Fascinado por ela, já perdeu dias e semanas com a banda larga na veia, fa­­zendo nada – até perceber que ou reorganizava o tempo ou viraria um zumbi do monitor. Algumas medidas básicas funcionaram: não leio e-mails que não sejam pessoais e resisto a “sur­­far”. Quando ligo o computador, sei o que procuro: percorrer jornais ou fazer consultas (e nessa área de referência, a revolução da internet é absolutamen­­te fantástica).

Mas dia desses escapei distraí­­do para uma ponte com “co­­men­­tários de leitor”, que passaram a me atrair, primeiro como curiosidade linguística, depois como sociologia, e atualmente como, digamos, aspectos patológicos do comportamento cotidiano. Fi­­quei impressionado com a violên­­cia dos comentários, o grau de agressividade, o pri­­marismo ar­­gu­­mentativo, o desejo de ferir – enfim, a estupidez pura e simples em que tanto o bom como o mau domínio da escrita se mesclam com o desejo de sangue a qualquer custo. Qualquer tema é gancho para o jogo baixo, o preconceito escarrado, o ressentimento, o rancor miúdo, sempre ocultos no pseudônimo: dos candidatos ao governo às notícias policiais, das páginas de cultura ao preço dos carros, do futebol ao cinema, tudo é argumento para o tacape digital assassino, incapaz de uma ponderação civilizada. Como se o inconsciente selvagem de cada um, sem filtro, ga­­nhasse vida num clique. Acom­­panhar comentários de leitores na internet é quase sempre uma viagem chocante, inútil, deprimente.

Talvez eu esteja mesmo fi­­cando velho, saudoso de uma cor­­dialidade brasileira que nunca existiu, exceto no papel. As estatísticas mostram que o Brasil é um dos países mais violentos do mundo, e no conforto da classe média tendemos a achar que isso é um problema distante. Mas, no escurinho da internet, vemos que o país real está muito próximo e mostra os dentes em toda parte.

22.4.10

Amazônia e o crime legal

Texto de Lúcio Flávio Pinto sobre a história mais recente da Amazônia.
O crime legal

A história contemporânea da Amazônia segue dois marcos. Sem considerá-los, ninguém poderá entender o que acontece na região. O primeiro deles, por ordem cronológica, tem dois desdobramentos. Começou na segunda metade da década de 50 do século passado, quando pela primeira vez a Amazônia foi integrada por terra ao restante do país, inicialmente através das rodovias Belém-Brasília e Brasília-Acre (seguidas de outras estradas de porte semelhante, como a Transamazônica).

Esse marco foi arrematado duas décadas depois, quando os militares, no poder pelo período mais longo de todas as suas intervenções na vida política brasileira, decidiram acelerar a ocupação desencadeada pelas estradas. O lema era categórico: “integrar para não entregar”.

Uma longa tradição de raciocínio geopolítico muito forte, sobretudo na caserna, garantia que a Amazônia era objeto, desde o início da presença européia, de uma cobiça internacional profunda, persistente e ameaçadora. Ela só não se consumara porque o colonizador português mostrara sua valentia (além de sagacidade) na defesa (e expansão) das fronteiras amazônicas. Esse sentimento foi repassado ao nativo.

Mas essas qualidades já não eram suficientes para assegurar a soberania nacional sobre a mais extensa e rica fronteira do país. Os “espaços vazios” constituíam o ponto frágil da vigilância e da defesa da integridade territorial. Era preciso que cidadãos nacionais ocupassem esses espaços, atraídos pelas promessas de enriquecimento e intensamente apoiados pelo governo (inclusive através de colaboração financeira do erário). A Amazônia precisava deixar sua condição de reserva e passar a produzir.

Essa contingência se impôs quando de outro marco: a primeira crise do petróleo, de 1973. O mundo se redefiniu para se adaptar ao novo custo da energia. Em nenhum lugar do mundo há mais energia contida na natureza do que na Amazônia. Em seus rios caudalosos, no seu subsolo, nas suas árvores, nas suas chuvas, no seu sol. Um dos lugares-chave da nova redivisão internacional da Amazônia passou a ser a Amazônia.

Ela tem duas das maiores fábricas de alumínio do planeta (e o alumínio é o bem industrial mais eletrointensivo que existe), a maior fábrica de alumina, algumas das principais plantas minerais, a quarta maior hidrelétrica da Terra. Quase todos esses bens e insumos são remetidos para o exterior. As empresas que os produzem contam com participação acionária de algumas das principais multinacionais. A Amazônia, internacionalizada desde a sua origem (foram os espanhóis que lhe deram esse nome) e nacionalizada só recentemente, já sob o Império, nunca foi tão internacionalizada quanto agora. E nunca tão integrada à economia nacional. Ao contrário do que pensavam os militares no poder, uma coisa levou à outra, ao invés de impedi-lo.

Os estrangeiros parecem ter aprendido que é mais cômodo e mais rentável explorar as riquezas da Amazônia sob um governo local do que abrindo filial colonial da metrópole no além-mar. Os relatos sobre tentativas de intervenção estrangeira direta não resistem a um exame mais apurado.

Diz a lenda (revestida de verdade histórica nos manuais de ocasião, muito caros aos nacionalistas) que, no século XIX, a poderosa Inglaterra só não anexou a Amazônia porque Eduardo Angelim, o principal líder da Cabanagem, a maior insurreição popular da história brasileira (irrompida em 1835), rejeitou as propostas insinuantes de autonomia de um representante britânico, colocando-o para correr.

Documentos oficiais ingleses, aos quais só recentemente se teve acesso, revelaram que o próprio governo brasileiro, na época chefiado pelo regente paulista Diogo Feijó (em nome do imperador Pedro II, ainda menor), autorizou a Inglaterra a invadir secretamente a convulsionada província para reprimir os rebeldes. A tarefa estava além das possibilidades das tropas brasileiras, empenhadas em combater outra grave insurreição, a dos Farrapos, no outro extremo do país, o Rio Grande do Sul.

Navios da armada inglesa (a mais poderosa da época) estiveram em Belém e seu comandante concluiu que dominaria tudo com apenas 150 fuzileiros navais. Se quisesse fazer da Amazônia uma nova Índia, era o momento. Feitos os cálculos, Sua Majestade verificou que lucraria mais mantendo a nacionalidade brasileira. Ao invés de tropa, mandou seu banco e financiou o início da exploração da borracha. O Banco do Brasil levou quase um século para se instalar na região, depois de criado.

O ministro das relações exteriores da Inglaterra, Lorde Palmerston, instruído pelo embaixador no Rio de Janeiro, não aceitou a proposta de Feijó para a invasão secreta, a repressão e a pacificação da província distante, que seria devolvida então ao governo imperial. Apresentou várias justificativas relacionadas à legalidade e à autodeterminação dos povos, mas, na verdade, tinha em mente números.

A Inglaterra ganhou muito dinheiro comprando e financiando a borracha amazônica. E, depois, quando constatada a inviabilidade de aumentá-la na escala exigida, partiu para o sucedâneo asiático, a partir de sementes coletadas no Pará. Tudo dentro da lei. Sem contrabando, ao contrário do que proclama outra lenda compensatória.

A “pacificação” da província rebelde, que o governo imperial acabou por assumir, foi mais sangrenta do que os motins políticos. Depois de cinco anos de conflagração, 20% da população da Amazônia morrera, com maior ênfase na fase da “pacificação”. Se fosse hoje, seriam mais de dois milhões de mortos. Há algo semelhante na história do Brasil? Não é tão frequente nem na belicosa história da humanidade.

Histórias de pé quebrado sobre a “cobiça internacional” da literatura geopolítica têm servido de habeas corpus ao saque dos recursos amazônicos, inclusive humanos, praticado pelos nacionais. Possibilitam até a pilhagem internacional, sem chamar a atenção da opinião pública, condicionada a achar que internacionalização é sinônimo de invasão armada.

Foi assim que o governo federal conseguiu criar o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia). Dizia-se que os Estados Unidos aproveitariam uma manobra militar conjunta na vizinha (ex-inglesa) Guiana (o Brasil foi convidado e não aceitou), para ensaiar a invasão da Amazônia. Usaria o conceito de “soberania limitada”, ao qual a Amazônia estaria sujeita por ser patrimônio da humanidade.

Assim, o Sivam, mesmo custando dois bilhões de dólares, não passou por concorrência. Era mais uma ação de emergência pela defesa da ameaçada segurança nacional na Amazônia, alvo da insaciável cobiça internacional. A dispensa de licitação criou um dos escândalos que abalou a administração do presidente Fernando Henrique Cardoso.

De lá para cá as exportações amazônicas cresceram mais de quatro vezes, a participação acionária de empresas estrangeiras se expandiu e os vínculos ao mercado mundial foram reforçados. Há menos “espaços vazios”, não só porque a população cresceu a uma taxa superior à da média nacional, como porque os pioneiros que abrem essas frentes foram responsáveis pelo maior desmatamento de toda história da humanidade: em meio século puseram abaixo área equivalente a três vezes o tamanho do Estado de São Paulo, que concentra um terço da riqueza nacional.

Ou seja: integrada, para não ser entregue aos piratas estrangeiros (ou aos “marines” americanos), a Amazônia paga aos seus protetores um preço. O de deixar de ser Amazônia. É assim que se torna Brasil, finalmente.

19.4.10

Para refletir sobre o abril vermelho.

A seguir interessante entrevista com o Prof. Miguel Carter, publicada na revista Carta Capital na primeira semana de abril.


Democracia agrária

05/04/2010 12:33:18

Rodrigo Martins

Professor da American University (EUA), Miguel Carter pesquisa há quase duas décadas os conflitos fundiários e a luta pela terra no Brasil. Nascido no México e criado no Paraguai, o cientista político percorreu mais de 160 mil quilômetros a bordo de um fusca preto pelos rincões do Brasil desde 1987, quando, ainda estudante, decidiu desbravar o interior com um mochilão nas costas. No início dos anos 90, já com uma bolsa de estudos da Columbia University, voltaria à rotina de viagens pelo País, desta vez com uma proposta de pesquisa mais elaborada, dedicada a lançar luzes sobre a questão fundiária brasileira.

O pesquisador acaba de lançar um livro sobre o tema, Combatendo a Desigualdade Social – O MST e a reforma agrária no Brasil (Editora Unesp, 564 págs., R$ 65). Trata-se de uma coletânea de artigos escritos por renomados pesquisadores de universidades brasileiras, europeias e dos Estados Unidos, um trabalho que tem sido coordenado e organizado por Carter desde 2003.

Na obra, Carter destaca a importância da reforma agrária para reduzir as desigualdades sociais e defende a necessidade- de o Estado investir em políticas de redistribuição de renda. “Os estudos compravam que, quando temos uma situação de extrema desigualdade, isso atrapalha o desenvolvimento econômico.”

CartaCapital: No Brasil, há quem defenda que o País precisa crescer antes de repartir suas riquezas. O senhor defende o inverso. Por quê?

Miguel Carter: O Banco Mundial e o Bando Interamericano de Desenvolvimento (BID) têm feito estudos importantes, inclusive com avaliações econométricas, comprovando que, quando temos uma situação de extrema desigualdade, isso atrapalha o desenvolvimento econômico. Quem não tem acesso ao crédito, à terra e à educação não tem condições de produzir nem consumir, e isso impede o PIB de crescer. Nancy Birdsall, do Center for Global Development, comparou o desempenho da economia brasileira com o da Coreia do Sul, país que, após a Segunda Guerra Mundial, promoveu uma reforma agrária radical. E, ao fazer uma simulação, constatou que a economia brasileira teria crescido 17,2% mais entre 1960 e 1985 se tivesse os níveis sul-coreanos de igualdade social. A disparidade de renda custou ao Brasil ao menos 0,66% do PIB todos os anos.

CC: O que há de errado com o modelo de desenvolvimento?

MC: A questão central é o tipo de crescimento que estamos promovendo. De acordo com um relatório do Banco Mundial, o Brasil poderia reduzir a pobreza pela metade em dez anos com um crescimento de 3% e uma melhora do coeficiente Gini (indicador de desigualdade) de 5%. No entanto, o País levaria 30 anos para cumprir esse objetivo com os mesmos 3% de crescimento e nenhuma melhora na distribuição de renda.

CC: A reforma agrária é, de fato, capaz de reduzir as disparidades sociais?

MC: Ela é fundamental. Não é o único instrumento. Tem vários outros, como política salarial, de previdência, educação... É o conjunto dessas políticas que pode mudar o quadro de extrema desigualdade. O Brasil melhorou a distribuição de renda, mas ainda é o décimo país mais desigual do mundo. A reforma agrária pode contribuir para a redistribuição das riquezas, além de evitar o êxodo rural e estimular o desenvolvimento local. O Brasil poderia seguir o exemplo de diversos países asiáticos, que há décadas fixaram limites para o tamanho da propriedade rural. Na Coreia do Sul, é de 3 hectares. No Japão, varia de 1 a 10 hectares, conforme o acesso à irrigação.

CC: A que se deve o atraso brasileiro em promover uma ampla reforma agrária?
MC: O principal fator é o poder que tem a elite agrária no Brasil. Desde o tempo de Colônia, é um setor muito forte. Joaquim Nabuco e outros liberais já falavam em reforma agrária na época do Império, mas essa discussão sempre foi barrada. Getúlio Vargas, na década de 30, deu direitos aos trabalhadores urbanos, mas nem sequer permitiu a legalização dos sindicatos rurais. A classe camponesa foi a mais marginalizada e a que sofreu as piores repressões, nos diversos momentos autoritários.

CC: De que forma o governo favoreceu a elite agrária?

MC: No regime militar, o governo decidiu investir no fortalecimento e na modernização da agricultura, com uma grande carga de subsídios. Até hoje o volume de gastos estatais com o chamado agronegócio é muito superior ao pago à agricultura familiar. Estima-se a existência de 22 mil grandes proprietários que receberam, entre 1995 e 2005, algo em torno de 58,2 bilhões de dólares do governo federal. Ao passo que mais de 6,1 milhões de camponeses receberam apenas 10,2 bilhões no mesmo período. Essa política de forte estímulo à agricultura empresarial, em detrimento dos pequenos produtores, é fruto da ditadura.

CC: O que explica o surgimento de um movimento como o MST nesse cenário desfavorável?

MC: Após a redemocratização do País, criou-se um espaço para reivindicações, com maior liberdade de associação. É nesse contexto que surgem os movimentos sociais. No campo, o MST é o maior deles, o mais reconhecido. Mas a reforma agrária promovida nos últimos anos foi conservadora. Houve alguma redistribuição de terra, mas sempre após longos processos burocráticos e de forma residual. Não se redistribui terra pensando em mudar a estrutura agrária. E quase sempre isso ocorre em locais que não são de interesse da elite. Em áreas afastadas, na Amazônia, ou em pastagens não muito valorizadas.

CC: O que garantiu o êxito do MST?

MC: O MST decidiu bem cedo criar um movimento nacional, com dinâmica de mobilização de massas. E conseguiu isso com um êxito sem precedentes na história do Brasil. Juntar 12 mil pessoas, em 17 dias, para uma marcha pelo País em 2005, é uma coisa inédita não apenas na história brasileira como do mundo inteiro. Além disso, o MST criou importantes estratégias. Articulou-se em rede, criou uma estrutura descentralizada, baseada em processos decisórios coletivos. Não existe reforma agrária sem o Estado, assim como é muito difícil o governo promovê-la sem que haja reivindicação, uma demanda organizada. E o MST surge para organizar essa demanda. O movimento contribui para a democratização do País.

CC: Por quê?

MC: O MST vai aonde está a população mais pobre do Brasil e a convida para participar do movimento. O pessoal envolve-se nos acampamentos, aprende sobre os seus direitos, conhece a política do Brasil. Criam-se assim verdadeiras escolas de cidadania. As pessoas de fora entendem essa dinâmica melhor que vários intelectuais do Brasil, que veem uma ocupação de terra como um grande desrespeito ao Estado de Direito. Eles não entendem que a luta pela democratização implica choques desse tipo. Ás vezes é preciso violar certas leis em razão de um princípio maior. Os movimentos sociais não são inimigos, são arquitetos de uma nova ordem jurídica. O movimento operário, por exemplo, foi fundamental para a criação das atuais leis trabalhistas.

CC: E como o Judiciário se porta diante dessas demandas?

MC: O Judiciário, de modo geral, é um grande obstáculo. Não porque as leis são as piores. A lei permite a reforma agrária. O problema é a interpretação. Em boa parte, isso tem relação com a origem de classe dos juízes. Muitos são filhos de grandes fazendeiros, frequentam os mesmos clubes. Também há a questão da formação, que enfatiza certos aspectos da lei, e não outros.

CC: A partir do governo FHC, há uma maior distribuição de terras no Brasil, ainda que sob a perspectiva de uma reforma agrária conservadora, como o senhor define. Há alguma diferença entre a política de FHC e a do governo Lula?

MC: Comparados com os demais presidentes, eles distribuíram mais terra. Fernando Henrique, até pela conjuntura, o massacre de Eldorado dos Carajás, uma mobilização intensa, investiu nisso. Lula, de modo geral, mais ou menos manteve o que FHC fez. Eu tenho uma visão de reforma agrária mais restrita que a do Incra. Eu, por exemplo, excluo dos números da reforma agrária aquilo que é relacionado à regularização fundiária. Também não considero as áreas de reserva extrativista na Amazônia. Sou a favor, mas isso é um outro tipo de política. Excluindo esses dados, o número de assentamentos dos dois é muito semelhante.

CC: Não há nenhuma diferença?

MC: Houve, no governo Lula, a criação de uma série de programas de apoio à reforma agrária, como acesso ao microcrédito, incremento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, aumento da eletrificação rural. Aumentaram os recursos para a agricultura familiar. Nesse sentido, Lula foi menos conservador do que FHC. Por outro lado, Lula assentou muito mais gente na Amazônia e no Norte do Brasil, repetindo um padrão de colonização da época da ditadura.

CC: O Brasil foi capaz de estancar a concentração de terras?

MC: Essa reforma conservadora apenas reduziu o ritmo da concentração de terras, mas não foi capaz de desconcentrar nada. Para isso, seria necessária uma reforma progressista. Mas isso não está em pauta no governo. Está na pauta do MST e de alguns partidos de esquerda. No momento, infelizmente, a disputa é pela sobrevivência dessa reforma conservadora. Ou isso ou nada.

Futuro próximo!!

De que maneira, nós brasileiros, esperamos e queremos que aconteça o crescimento dos próximos 10 anos?

Nosso país irá crescer a altos índices econômicos, a uma velocidade que talvez jamais foi vista anteriormente.
Ótimo!! Em um primeiro momento se pensamos assim. Porém o que preocupa é como "enfrentaremos" isso.

O povo não tem educação e tampouco conhecimento para assimilar essa situação, e saber aproveitar essa oportunidade, a maioria das pessoas participará única e exclusivamente deste processo de crescimento, sendo manipulados a comprar e a consumir "bens", que se pensarmos um pouco, nos condenarão futuramente (carros, etc..)

A infra estrutura (sustentável) do país é uma piada, falha e dificilmente crescerá no ritmo da economia, o custo País é o mais alto do mundo. Teremos que nos acostumar a nos acotovelar com os caminhões carregados de soja e minério nas estradas quando estivermos saindo de férias com nossas famílias, porque o país não criou e ainda por cima abandonou, na época do "milagre econômico", uma rede ferroviária decente, por conta da promessa dos "american petrodollars" das empresas que estavam entrando.
Vamos ter que utilizar armazéns e silos improvisados em áreas de proteção ambiental, porque os portos não comportarão a "fome" de consumo dos países que compram nossa matéria prima (China, entre outros..). Isso sem falar da rápida industrialização da agricultura, sem limites e critérios.

Bom, pensando um pouco melhor o nosso crescimento econômico pode ser catastrófico sim. Ninguém sabe ao certo o que ocorrerá com o Brasil. Culpa dos nossos governantes que fazem as políticas de 4 em 4 anos, pensando somente em reeleições sem preparar um plano Brasil? Com certeza, concordo plenamente. Porém eu iria mais fundo, é triste afirmar, mas a nossa sociedade é alienada, não existe debate em nenhum nível da sociedade, as classes profissionais somente buscam o benefício próprio, bajulando e apoderando o pior tipo de classe "profissional", os políticos profissionais.

Nossa imprensa tem o poder de eleger presidentes, a revista mais lida no país já começou sua descarada campanha essa semana com a reportagem de capa, e isso vem acontecendo desde a época da ditadura. Nossa maior emissora põe em debate na boca do povo um programa que é uma jaula de pessoas hipócritas, e impõe um estilo de vida consumista e colonial, para que ninguém se de conta do que ocorre, do velho conformismo dos pobres servindo os "sem cérebros" ricos herdeiros. Pobres esses que enquanto tiverem dinheiro para assar sua carne da "Bertin", e tomar sua cerveja lícita da "Imbev ou Coca-Cola" continuarão fazendo festa, porque foram assim instruídos. E o que falar dos ricos com nome e sobrenome como pedigree? Que são os herdeiros de quem tomam as decisões, e que tomarão as decisões? Não conseguem ver um palmo a frente, foram criados para ter medo e manter a riqueza que lhes foi proporcionada, entram em seus carros, fecham a janela ligam o ar condicionado, e só param no estacionamento do shopping, ou do condomínio do amigo de infância, conversar sobre o que está "in", para eles já não existe espaço público.

E como queremos que esse crescimento econômico nos beneficie? Vamos deixar esse momento passar e daqui a 10 ou 15 anos vamos nos lamentar e ver que não aproveitamos nada? Que a educação e a desigualdade do país continuam igual, e que os únicos "realmente" beneficiados foram os mesmos do passado e os que hoje em dia continuam ganhando e que estão “ferrados” na “crise”?

Tudo isso por que não fomos capazes de perceber e atuar no presente, porque continuamos alienados e estaremos assistindo e debatendo o BBB17, e então o país crescerá somente 10 anos, e logo se afundará. E não saberemos onde meter nossas televisões de Plasma e nossos carros com ar condicionado.

Mais do que dinheiro e crescimento econômico, o Brasil, precisa de uma inversão de valores, e isso só depende da sociedade. Da educação e da intelectualidade sociedade, como também do pensamento coletivo. Só depende de nós!!